quarta-feira, 25 de outubro de 2017

Para presidente da CNBB, não se pode responder intolerância com intolerância

Para Dom Sérgio, o artista é livre, mas não pode ofender nossos símbolos religiosos

Da redação, com Rádio Vaticano

O Arcebispo de Salvador e Primaz do Brasil, Dom Murilo Krieger / Foto: Arquivo CN

Nas últimas semanas, muito foi sido dito a respeito das exposições com uso de símbolos religiosos e que abordaram, de forma polêmica, temas envolvendo sexualidade. A sociedade questionou os limites da arte e a liberdade de expressão dos artistas envolvidos nestes casos.
O Cardeal Arcebispo de Brasília e Presidente da CNBB, Dom Sérgio da Rocha, o Secretário da entidade, Dom Leonardo Steiner e o Arcebispo de Salvador e Primaz do Brasil, Dom Murilo Krieger discutiram este tema numa entrevista concedida à Rádio Vaticano. Confira:

Rádio Vaticano — O problema da mistura da arte com símbolo da arte, esta mistura com símbolos religiosos. Como o senhor vê isto?

Dom Murilo Krieger — Há uma ideia que às vezes se espalha de que o artista não tem limites, quando a gente sabe que todo mundo gosta ser respeitado. E se toma a arte como se fosse um campo onde não houvesse ética. Ora, quando valores nossos são atacados – valores religiosos, ou então da raça – por exemplo, não é porque o artista é livre que ele pode ofender judeus, não pode ofender negros, ou afrodescendentes. Também não pode ofender nossos símbolos religiosos. Então muitas vezes eles tentam deslocar a conversa e a discussão, mas quase só sobre o problema do nudismo, mas acho que é em segundo plano. O problema é que valores que cada um tem e que têm que ser respeitados. Se não fica um campo de agressividade maior. Então o que a gente nota, é que muitas mães de família, pais de família, logo se colocaram na situação do filho, ele não tem direito de ser agredido por algo que não me interessa que ele veja e toque. E a gente nota algo muito positivo, uma reação da sociedade. Claro, que aí vem o pessoal que chama de os retrógrados, os conservadores, os direitistas. Ou seja, tentar abafar a voz de quem pensa diferente, de uma forma assim agressiva. Mas eu penso que isto tudo está obrigando todos nós a tomarmos consciência, que devemos e temos o direito de defender nossos valores. Não é porque alguém se sente inspirado não sei por quem, pode ofender-nos assim gratuitamente.

Rádio Vaticano — Dom Leonardo, o senhor que está em Brasília, naturalmente a CNBB recebe tudo, como o senhor diz, procuraram muito também os senhores por esta questão?
O secretário geral da CNBB, Dom Leonardo Steiner / Foto: Imprensa CNBB

Dom Leonardo Steiner — É, fomos muito procurados e nós achamos melhor não emitirmos nota, mas ajudarmos na reflexão. Aquilo que Dom Murilo acaba de dizer é vital. Vejo que a questão da sexualidade ela está sendo abordada de maneira quase superficial, e se diz como arte. Quando a sexualidade humana exige um certo distanciamento, exige uma intimidade que lhe é própria. É porque a nossa sexualidade se diferencia da sexualidade animal. A sexualidade humana tem a ver com intimidade, tem a ver com amor, tem a ver com delicadeza, tem a ver com vida que se entrecruza, tem a ver com vida que está por vir. Então não se pode abordar a questão da sexualidade humana de qualquer maneira, de uma maneira escancarada. E eu penso que aqui tem alguns elementos que nós poderemos ajudar a refletir. Mesmo aqueles quadros expostos num dos museus, nos ajudam a refletir e a perceber assim a que ponto estamos chegando na sociedade brasileira em relação a questões que são vitais para a pessoa humana, para não decairmos em relação a nossa sexualidade, ao nosso amor, nas nossas relações. As nossas relações humanas, elas têm um significado muito próprio. Nós não podemos banalizar as relações humanas, senão nós começamos a decair como civilização, como sociedade brasileira. Eu creio que aqui existem alguns elementos antropológicos onde nós como CNBB podemos ajudar a refletir. Não estou aqui nem mencionando – como Dom Murilo já lembrou — as questões teológicas, as questões que o Evangelho nos propõe. Estou abordando aqui apenas no sentido antropológico, de pessoa, humana. E mesmo também os símbolos religiosos. Os símbolos religiosos têm a ver com a expressão de nossa humanidade. Os valores, os símbolos, nos dizem algo, eles fazem parte de nossa vida. Se não fazem parte da vida de algumas pessoas, de determinados grupos, nós não invadimos a intimidade, não invadimos as pessoas com nossa agressividade, colocando estes valores ou estes símbolos em cheque, ou desprezamos estes valores. Estes valores são respeitados porque para determinado grupo ou para determinadas pessoas têm um significado inclusive de transcendência. Não estou aqui nem falando de fé, estou falando de transcendência, para além do imediato da cotidianidade e que ajuda a enfrentar a cotidianidade das pessoas. Eu não estou falando aqui apenas dos nossos símbolos católicos, estou falando dos símbolos que, por exemplo, o candomblé tem os seus símbolos e que estão sendo também agredidos. E existe – Dom Sérgio antes estava falando — uma intolerância religiosa que vai aparecendo também na agressividade em relação aos símbolos, que vai aparecendo também em relação à arte. A própria arte às vezes está incentivando a intolerância. Então creio que existem aqui alguns elementos, e estes foram aparecendo, e nós, como CNBB, tentamos ajudar a refletir. Certamente, o Conselho Permanente deve ainda também se manifestar a este respeito. Mas eu creio que também nisto temos sim uma contribuição a dar. Porque a intolerância está aparecendo também em forma de arte. E aí corremos um perigo muito grande.

O Cardeal Arcebispo de Brasília e Presidente da CNBB, Dom Sérgio da Rocha / Foto: 
Arquivo – Arquidiocese de Brasília

Rádio Vaticano — Neste contexto as redes sociais assumem um papel bastante arriscado, porque a sensibilidade das outras pessoas é facilmente pisoteada, porque a gente não tem um interlocutor na frente e fica aquela avalanche de ofensas e insultos que vai sempre crescendo.

Dom Sérgio da Rocha — E também, eu acho, o cuidado em não compartilhar aquilo que não é bom. Eu não sei porque, as pessoas hoje passam prá frente com a maior facilidade ofensas, e às vezes sem maior razão de ser vão compartilhando, compartilhando, parece que por curiosidade, e com isto vão alimentando, vão divulgando também aquilo que não é bom. Acho que nós estamos precisando divulgar, compartilhar, aquilo que vale a pena, aquilo que constrói. Não que não vamos levar em conta, não se vai dar atenção àquilo que também seja considerado anticristão ou desumano. Mas eu creio que nós precisamos acima de tudo ter este cuidado de nas redes sociais não ficar compartilhando aquilo que não valeria a pena, coisa que não vale a pena ser passado para frente. E às vezes ela se multiplica de uma maneira impressionante, sem maior reflexão, sem maior posicionamento cristão.

FONTE: CANÇÃO NOVA

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