Para Dom Sérgio, o artista é livre, mas não pode ofender nossos símbolos religiosos
Da redação, com Rádio Vaticano

O Arcebispo de Salvador e Primaz do Brasil, Dom Murilo Krieger / Foto: Arquivo CN
Nas últimas semanas, muito foi sido dito a respeito das exposições
com uso de símbolos religiosos e que abordaram, de forma polêmica, temas
envolvendo sexualidade. A sociedade questionou os limites da arte e a
liberdade de expressão dos artistas envolvidos nestes casos.
O Cardeal Arcebispo de Brasília e Presidente da CNBB, Dom Sérgio da
Rocha, o Secretário da entidade, Dom Leonardo Steiner e o Arcebispo de
Salvador e Primaz do Brasil, Dom Murilo Krieger discutiram este tema
numa entrevista concedida à Rádio Vaticano. Confira:
Rádio Vaticano — O problema da mistura da arte com símbolo da arte, esta mistura com símbolos religiosos. Como o senhor vê isto?
Dom Murilo Krieger — Há uma ideia que às vezes se
espalha de que o artista não tem limites, quando a gente sabe que todo
mundo gosta ser respeitado. E se toma a arte como se fosse um campo onde
não houvesse ética. Ora, quando valores nossos são atacados – valores
religiosos, ou então da raça – por exemplo, não é porque o artista é
livre que ele pode ofender judeus, não pode ofender negros, ou
afrodescendentes. Também não pode ofender nossos símbolos religiosos.
Então muitas vezes eles tentam deslocar a conversa e a discussão, mas
quase só sobre o problema do nudismo, mas acho que é em segundo plano. O
problema é que valores que cada um tem e que têm que ser respeitados.
Se não fica um campo de agressividade maior. Então o que a gente nota, é
que muitas mães de família, pais de família, logo se colocaram na
situação do filho, ele não tem direito de ser agredido por algo que não
me interessa que ele veja e toque. E a gente nota algo muito positivo,
uma reação da sociedade. Claro, que aí vem o pessoal que chama de os
retrógrados, os conservadores, os direitistas. Ou seja, tentar abafar a
voz de quem pensa diferente, de uma forma assim agressiva. Mas eu penso
que isto tudo está obrigando todos nós a tomarmos consciência, que
devemos e temos o direito de defender nossos valores. Não é porque
alguém se sente inspirado não sei por quem, pode ofender-nos assim
gratuitamente.
Rádio Vaticano — Dom Leonardo, o senhor que está em
Brasília, naturalmente a CNBB recebe tudo, como o senhor diz, procuraram
muito também os senhores por esta questão?

O secretário geral da CNBB, Dom Leonardo Steiner / Foto: Imprensa CNBB
Dom Leonardo Steiner — É, fomos muito procurados e
nós achamos melhor não emitirmos nota, mas ajudarmos na reflexão. Aquilo
que Dom Murilo acaba de dizer é vital. Vejo que a questão da
sexualidade ela está sendo abordada de maneira quase superficial, e se
diz como arte. Quando a sexualidade humana exige um certo
distanciamento, exige uma intimidade que lhe é própria. É porque a nossa
sexualidade se diferencia da sexualidade animal. A sexualidade humana
tem a ver com intimidade, tem a ver com amor, tem a ver com delicadeza,
tem a ver com vida que se entrecruza, tem a ver com vida que está por
vir. Então não se pode abordar a questão da sexualidade humana de
qualquer maneira, de uma maneira escancarada. E eu penso que aqui tem
alguns elementos que nós poderemos ajudar a refletir. Mesmo aqueles
quadros expostos num dos museus, nos ajudam a refletir e a perceber
assim a que ponto estamos chegando na sociedade brasileira em relação a
questões que são vitais para a pessoa humana, para não decairmos em
relação a nossa sexualidade, ao nosso amor, nas nossas relações. As
nossas relações humanas, elas têm um significado muito próprio. Nós não
podemos banalizar as relações humanas, senão nós começamos a decair como
civilização, como sociedade brasileira. Eu creio que aqui existem
alguns elementos antropológicos onde nós como CNBB podemos ajudar a
refletir. Não estou aqui nem mencionando – como Dom Murilo já lembrou —
as questões teológicas, as questões que o Evangelho nos propõe. Estou
abordando aqui apenas no sentido antropológico, de pessoa, humana. E
mesmo também os símbolos religiosos. Os símbolos religiosos têm a ver
com a expressão de nossa humanidade. Os valores, os símbolos, nos dizem
algo, eles fazem parte de nossa vida. Se não fazem parte da vida de
algumas pessoas, de determinados grupos, nós não invadimos a intimidade,
não invadimos as pessoas com nossa agressividade, colocando estes
valores ou estes símbolos em cheque, ou desprezamos estes valores. Estes
valores são respeitados porque para determinado grupo ou para
determinadas pessoas têm um significado inclusive de transcendência. Não
estou aqui nem falando de fé, estou falando de transcendência, para
além do imediato da cotidianidade e que ajuda a enfrentar a
cotidianidade das pessoas. Eu não estou falando aqui apenas dos nossos
símbolos católicos, estou falando dos símbolos que, por exemplo, o
candomblé tem os seus símbolos e que estão sendo também agredidos. E
existe – Dom Sérgio antes estava falando — uma intolerância religiosa
que vai aparecendo também na agressividade em relação aos símbolos, que
vai aparecendo também em relação à arte. A própria arte às vezes está
incentivando a intolerância. Então creio que existem aqui alguns
elementos, e estes foram aparecendo, e nós, como CNBB, tentamos ajudar a
refletir. Certamente, o Conselho Permanente deve ainda também se
manifestar a este respeito. Mas eu creio que também nisto temos sim uma
contribuição a dar. Porque a intolerância está aparecendo também em
forma de arte. E aí corremos um perigo muito grande.

O Cardeal Arcebispo de Brasília e Presidente da CNBB, Dom Sérgio da Rocha / Foto:
Arquivo – Arquidiocese de Brasília
Rádio Vaticano — Neste contexto as redes sociais
assumem um papel bastante arriscado, porque a sensibilidade das outras
pessoas é facilmente pisoteada, porque a gente não tem um interlocutor
na frente e fica aquela avalanche de ofensas e insultos que vai sempre
crescendo.
Dom Sérgio da Rocha — E também, eu acho, o cuidado em
não compartilhar aquilo que não é bom. Eu não sei porque, as pessoas
hoje passam prá frente com a maior facilidade ofensas, e às vezes sem
maior razão de ser vão compartilhando, compartilhando, parece que por
curiosidade, e com isto vão alimentando, vão divulgando também aquilo
que não é bom. Acho que nós estamos precisando divulgar, compartilhar,
aquilo que vale a pena, aquilo que constrói. Não que não vamos levar em
conta, não se vai dar atenção àquilo que também seja considerado
anticristão ou desumano. Mas eu creio que nós precisamos acima de tudo
ter este cuidado de nas redes sociais não ficar compartilhando aquilo
que não valeria a pena, coisa que não vale a pena ser passado para
frente. E às vezes ela se multiplica de uma maneira impressionante, sem
maior reflexão, sem maior posicionamento cristão.
FONTE: CANÇÃO NOVA
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