Os
cristãos leigos e leigas não podem “abdicar da participação na
política”, afirma a mensagem dos bispos do Brasil
André
Cunha
Enviado
especial a Aparecida
“Os
cristãos católicos, de maneira especial, são chamados a dar razão
de sua esperança nesse tempo de profunda crise pela qual passa o
Brasil”. É o que afirma a mensagem da CNBB sobre eleições
municipais 2016 divulgada nesta quarta-feira, 13, durante a coletiva
de imprensa na 54ª Assembleia Geral dos Bispos.
Dom
Murilo Krieger(esq.) e Dom Roberto Ferrería Paz durante
apresentação da mensagem para eleições 2016 / Fopto: André
Cunha – CN
Os
bispos destacam na mensagem a atração e força próprias pela
proximidade dos candidatos com os eleitores, nas eleições
municipais. Isso, por um lado, desperta mais interesse e facilita as
relações, mas por outro lado, diz a mensagem, pode levar a práticas
condenáveis como a compra de votos.
“A
compra e a venda de votos e o uso da máquina administrativa nas
campanhas eleitorais constituem crime eleitoral que atenta contra a
honra do eleitor e contra a cidadania. Exortamos os eleitores a
fiscalizarem os candidatos e, constatando esse ato de corrupção, a
denunciarem os envolvidos ao Ministério Público e à Justiça
Eleitoral, conforme prevê a Lei 9.840, uma conquista da mobilização
popular há quase duas décadas”.
A
mensagem também reafirma a posição da Igreja Católica, que não
assume nenhuma candidatura, mas incentiva os cristãos leigos e
leigas, que têm vocação para a militância político-partidária,
a se lançarem candidatos.
Confira,
a seguir, a íntegra da nota:
“Quero
ver o direito brotar como fonte e correr a justiça qual riacho que
não seca” (Amós 5,24)
Neste
ano de eleições municipais, a Conferência Nacional dos Bispos do
Brasil – CNBB dirige ao povo brasileiro uma mensagem de esperança,
ânimo e coragem. Os cristãos católicos, de maneira especial, são
chamados a dar a razão de sua esperança (cf. 1Pd 3,15) nesse tempo
de profunda crise pela qual passa o Brasil.
Sonhamos
e nos comprometemos com um país próspero, democrático, sem
corrupção, socialmente igualitário, economicamente justo,
ecologicamente sustentável, sem violência discriminação e
mentiras; e com oportunidades iguais para todos. Só com participação
cidadã de todos os brasileiros e brasileiras é possível a
realização desse sonho. Esta participação democrática começa no
município onde cada pessoa mora e constrói sua rede de relações.
Se quisermos transformar o Brasil, comecemos por transformar os
municípios. As eleições são um dos caminhos para atingirmos essa
meta.
A
política, do ponto de vista ético, “é o conjunto de ações
pelas quais os homens buscam uma forma de convivência entre
indivíduos, grupos, nações que ofereçam condições para a
realização do bem comum”. Já do ponto de vista da organização,
a política é o exercício do poder e o esforço por conquistá-lo1,
a fim de que seja exercido na perspectiva do serviço.
Os
cristãos leigos e leigas não podem “abdicar da participação na
política” (Christifideles Laici, 42). A eles cabe, de maneira
singular, a exigência do Evangelho de construir o bem comum na
perspectiva do Reino de Deus. Contribui para isso a participação
consciente no processo eleitoral, escolhendo e votando em candidatos
honestos e competentes. Associando fé e vida, a cidadania não se
esgota no direito-dever de votar, mas se dá também no
acompanhamento do mandato dos eleitos.
As
eleições municipais têm uma atração e uma força próprias pela
proximidade dos candidatos com os eleitores. Se, por um lado, isso
desperta mais interesse e facilita as relações, por outro, pode
levar a práticas condenáveis como a compra e venda de votos, a
divisão de famílias e da comunidade. Na política, é fundamental
respeitar as diferenças e não fazer delas motivo para inimizades ou
animosidades que desemboquem em violência de qualquer ordem.
Para
escolher e votar bem é imprescindível conhecer, além dos programas
dos partidos, os candidatos e sua proposta de trabalho, sabendo
distinguir claramente as funções para as quais se candidatam. Dos
prefeitos, no poder executivo, espera-se “conduta ética nas ações
públicas, nos contratos assinados, nas relações com os demais
agentes políticos e com os poderes econômicos”2. Dos
legisladores, os vereadores, requer-se “uma ação correta de
fiscalização e legislação que não passe por uma simples presença
na bancada de sustentação ou de oposição ao executivo”3.
É
fundamental considerar o passado do candidato, sua conduta moral e
ética e, se já exerce algum cargo político, conhecer sua atuação
na apresentação e votação de matérias e leis a favor do bem
comum. A Lei da Ficha Limpa há de ser, neste caso, o instrumento
iluminador do eleitor para barrar candidatos de ficha suja.
Uma
boa maneira de conhecer os candidatos e suas propostas é promover
debates com os concorrentes. Em muitos casos cabe propor lhes a
assinatura de cartas-compromisso em relação a alguma causa
relevante para a comunidade como, por exemplo, a defesa do direito de
crianças e adolescentes. Pode ser inovador e eficaz elaborar
projetos de lei, com a ajuda de assessores, e solicitar a adesão de
candidatos no sentido de aprovar os projetos de lei tanto para o
executivo quanto para o legislativo.
É
preciso estar atento aos custos das campanhas. O gasto exorbitante,
além de afrontar os mais pobres, contradiz o compromisso com a
sobriedade e a simplicidade que deveria ser assumido por candidatos e
partidos. Cabe aos eleitores observar as fontes de arrecadação dos
candidatos, bem como sua prestação de contas. A lei que proíbe o
financiamento de campanha por empresas, aplicada pela primeira vez
nessas eleições, é um dos passos que permitem devolver ao povo o
protagonismo eleitoral, submetido antes ao poder econômico. Além
disso, estanca uma das veias mais eficazes de corrupção, como
atestam os escândalos noticiados pela imprensa. Da mesma forma, é
preciso combater sistematicamente a vergonhosa prática de “Caixa
2”, tão comum nas campanhas eleitorais.
A
compra e venda de votos e o uso da máquina administrativa nas
campanhas constituem crime eleitoral que atenta contra a honra do
eleitor e contra a cidadania. Exortamos os eleitores a fiscalizarem
os candidatos e, constatando esse ato de corrupção, a denunciarem
os envolvidos ao Ministério Público e à Justiça Eleitoral,
conforme prevê a Lei 9840, uma conquista da mobilização popular há
quase duas décadas.
A
Igreja Católica não assume nenhuma candidatura, mas incentiva os
cristãos leigos e leigas, que têm vocação para a militância
político-partidária, a se lançarem candidatos. No discernimento
dos melhores candidatos, tenha-se em conta seu compromisso com a
vida, com a justiça, com a ética, com a transparência, com o fim
da corrupção, além de seu testemunho na comunidade de fé.
Promova-se a renovação de candidaturas, pondo fim ao carreirismo
político. Por isso, exortamos as comunidades a aprofundarem seu
conhecimento sobre a vida política de seu município e do país,
fazendo sempre a opção por aqueles que se proponham a governar a
partir dos pobres, não se rendendo à lógica da economia de mercado
cujo centro é o lucro e não a pessoa.
Após
as eleições, é importante a comunidade se organizar para
acompanhar os mandatos dos eleitos. Os cristãos leigos e leigas,
inspirados na fé que vem do Evangelho, devem se preparar para
assumir, de acordo com sua vocação, competência e capacitação,
serviços nos Conselhos de participação popular, como o da
Educação, Saúde, Criança e Adolescente, Juventude, Assistência
Social etc. Devem, igualmente, acompanhar as reuniões das Câmaras
Municipais onde se votam projetos e leis para o município. Estejam
atentos à elaboração e implementação de políticas públicas que
atendam especialmente às populações mais vulneráveis como
crianças, jovens, idosos, migrantes, indígenas, quilombolas e os
pobres.
Confiamos
que nossas comunidades saberão se organizar para tornar as eleições
municipais ocasião de fortalecimento da democracia que deve ser cada
vez mais participativa. Nosso horizonte seja sempre a construção do
bem comum.
Que
Nossa Senhora Aparecida, Mãe e Padroeira dos brasileiros, nos
acompanhe e auxilie no exercício de nossa cidadania a favor do
Brasil e de nossos municípios, onde começa a democracia.
Aparecida
– SP, 13 de abril de 2016
Dom
Sergio da Rocha
Arcebispo de Brasília
Presidente da CNBB
Dom
Murilo Sebastião Ramos Krieger, SCJ
Arcebispo São Salvador da
Bahia
Vice-Presidente da CNBB
Dom
Leonardo Ulrich Steiner
Bispo Auxiliar de
Brasília
Secretário-Geral da CNBB
______________________________________
1.
Cf. CNBB – Doc. 40 – Igreja Comunhão e Missão – n. 184.
2.
CNBB – Doc. 91 Por uma reforma do estado com participação
democrática, n. 40.
3. Idem.