A
CNBB avaliou questões
como a ameaça à democracia, a corrupção, a redução da
maioridade penal, a Lei da terceirização e outros temas atuais
Da
redação, com CNBB
Após
quase duas semanas de Assembleia Geral,
a CNBB divulgou, nesta sexta-feira, 24, uma nota em que avalia a
realidade do país. Os bispos enfatizaram questões como a “ameaça”
à democracia, a corrupção, a redução da maioridade penal e a Lei
da terceirização. Segundo a CNBB, esta lei, não pode, em hipótese
alguma, restringir os direitos dos trabalhadores.
Para
os bispos, o momento no Brasil não é de acirrar ânimos, “nem de
assumir posições revanchistas ou de ódio que desconsiderem a
política como defesa e promoção do bem comum”.
Leia
a íntegra do texto:
Nota
da CNBB sobre o momento nacional
“Entre
vós não deve ser assim” (Mc 10,43).
A
Conferência Nacional dos Bispos do Brasil – CNBB, reunida em sua
53ª Assembleia Geral, em Aparecida-SP, no período de 15 a 24 de
abril de 2015, avaliou, com apreensão, a realidade brasileira,
marcada pela profunda e prolongada crise que ameaça as conquistas, a
partir da Constituição Cidadã de 1988, e coloca em risco a ordem
democrática do País. Desta avaliação nasce nossa palavra de
pastores convictos de que “ninguém pode exigir de nós que
releguemos a religião para a intimidade secreta das pessoas, sem
qualquer influência na vida social e nacional, sem nos preocupar com
a saúde das instituições da sociedade civil, sem nos pronunciar
sobre os acontecimentos que interessam aos cidadãos” (EG, 183).
O
momento não é de acirrar ânimos, nem de assumir posições
revanchistas ou de ódio que desconsiderem a política como defesa e
promoção do bem comum. Os três poderes da República, com a
autonomia que lhes é própria, têm o dever irrenunciável do
diálogo aberto, franco, verdadeiro, na busca de uma solução que
devolva aos brasileiros a certeza de superação da crise.
A
retomada de crescimento do País, uma das condições para vencer a
crise, precisa ser feita sem trazer prejuízo à população, aos
trabalhadores e, principalmente, aos mais pobres. Projetos, como os
que são implantados na Amazônia, afrontam sua população, por não
ouvi-la e por favorecer o desmatamento e a degradação do meio
ambiente.
A
lei que permite a terceirização do trabalho, em tramitação no
Congresso Nacional, não pode, em hipótese alguma, restringir os
direitos dos trabalhadores. É inadmissível que a preservação dos
direitos sociais venha a ser sacrificada para justificar a superação
da crise.
A
corrupção, praga da sociedade e pecado grave que brada aos céus
(cf. Papa Francisco – O Rosto da Misericórdia, n. 19), está
presente tanto em órgãos públicos quanto em instituições da
sociedade. Combatê-la, de modo eficaz, com a consequente punição
de corrompidos e corruptores, é dever do Estado. É imperativo
recuperar uma cultura que prima pelos valores da honestidade e da
retidão. Só assim se restaurará a justiça e se plantará,
novamente, no coração do povo, a esperança de novos tempos,
calcados na ética.
A
credibilidade política, perdida por causa da corrupção e da
prática interesseira com que grande parte dos políticos exerce seu
mandato, não pode ser recuperada ao preço da aprovação de leis
que retiram direitos dos mais vulneráveis. Lamentamos que no
Congresso se formem bancadas que reforçem o corporativismo para
defender interesses de segmentos que se opõem aos direitos e
conquistas sociais já adquiridos pelos mais pobres.
A
Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 215/2000, por exemplo, é uma
afronta à luta histórica dos povos indígenas que até hoje não
receberam reparação das injustiças que sofreram desde a
colonização do Brasil. Se o prazo estabelecido pela Constituição
de 1988 tivesse sido cumprido pelo Governo Federal, todas as terras
indígenas já teriam sido reconhecidas, demarcadas e homologadas. E,
assim, não estaríamos assistindo aos constantes conflitos e mortes
de indígenas.
A
PEC 171/1993, que propõe a redução da maioridade penal para 16
anos, já aprovada pela Comissão de Constituição, Cidadania e
Justiça da Câmara, também é um equívoco que precisa ser
desfeito. A redução da maioridade penal não é solução para a
violência que grassa no Brasil e reforça a política de
encarceramento num país que já tem a quarta população carcerária
do mundo. Investir em educação de qualidade e em políticas
públicas para a juventude e para a família é meio eficaz para
preservar os adolescentes da delinquência e da violência.
O
Estatuto da Criança e do Adolescente, em vigor há 25 anos,
responsabiliza o adolescente, a partir dos 12 anos, por qualquer ato
contra a lei, aplicando-lhe as medidas socioeducativas. Não procede,
portanto, a alegada impunidade para adolescentes infratores. Onde
essas medidas são corretamente aplicadas, o índice de reincidência
do adolescente infrator é muito baixo. Ao invés de aprovarem a
redução da maioridade penal, os parlamentares deveriam criar
mecanismos que responsabilizem os gestores por não aparelharem seu
governo para a correta aplicação das medidas socioeducativas.
O
Projeto de Lei 3722/2012, que altera o Estatuto do Desarmamento, é
outra matéria que vai na contramão da segurança e do combate à
violência. A arma dá a falsa sensação de segurança e de
proteção. Não podemos cair na ilusão de que, facilitando o acesso
da população à posse de armas, combateremos a violência. A
indústria das armas está a serviço de um vigoroso poder econômico
que não pode ser alimentado à custa da vida das pessoas. Dizer não
a esse poder econômico é dever ético dos responsáveis pela
preservação do Estatuto do Desarmamento.
Muitas
destas e de outras matérias que incidem diretamente na vida do povo
têm, entre seus caminhos de solução, uma Reforma Política que
atinja as entranhas do sistema político brasileiro. Apartidária, a
proposta da Coalizão pela Reforma Política Democrática e Eleições
Limpas, da qual a CNBB é signatária, se coloca nessa direção.
Urge,
além disso, resgatar a ética pública que diz respeito “à
responsabilização do cidadão, dos grupos ou instituições da
sociedade pelo bem comum” (CNBB – Doc. 50, n. 129). Para tanto,
“como pastores, reafirmamos ‘Cristo, medida de nossa conduta
moral’ e sentido pleno de nossa vida” (Doc. 50 da CNBB, Anexo –
p. 30).
Que
o povo brasileiro, neste Ano da Paz e sob a proteção de Nossa
Senhora Aparecida, Padroeira do Brasil, supere esse momento difícil
e persevere no caminho da justiça e da paz.
Aparecida,
21 de abril de 2015.
Cardeal
Raymundo Damasceno Assis
Arcebispo de Aparecida
Presidente da
CNBB
Dom
José Belisário da Silva, OFM
Arcebispo de São Luís do
Maranhão
Vice Presidente da CNBB
Dom
Leonardo Ulrich Steiner
Bispo Auxiliar de Brasília
Secretário
Geral da CNBB
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